Todos conhecem a grande jornada dos peregrinos puritanos que chegaram a Massassuchessets em 1620, buscando liberdade religiosa longe da hegemonia anglicana. Esse marco histórico é quase sinônimo da fundação dos Estados Unidos, pois ali o primeiro assentamento inglês foi definitivamente estabelecido. Contudo, seria esse o primeiro assentamento europeu de forma geral, ou mais especificamente, seria a primeira vez que protestantes fugiam da perseguição de seus direitos religiosos?
Conheça a história das expedições huguenotes na Flórida (1562-1565) e descubra como eles foram responsáveis pela fundação da primeira cidade norte-americana.
Tensões na França
A Reforma francesa foi umas das mais turbulentas dentre as que ocorreram no século XVI. Enquanto a Inglaterra anglicana caminhava para a paz religiosa após instabilidade interna e os estados alemães luteranos conviviam em harmonia através da Paz de Augsburg (1555) e sua política de tolerância condicional, a França se via afundada em aparentemente intermináveis conflitos religiosos.
A casa de Valois começou concedendo limitada liberdade aos protestantes através das políticas conciliatórias de Francisco I (1515-1547), retomadas no começo do governo de seu neto Carlos IX (1560-1574), porém a pressão da radical casa de Guise e do intolerante clero romano no país somados ao temor que a Reforma causava na estabilidade de seu reinado o levou a tomar políticas mais rígidas, perpetuadas por seu sucessor Henrique II (1547-1559) e manifestas no tribunal da Chambre Ardente.
Isso gerou um grande desagrado por parte dos protestantes que aguardavam uma postura mais tolerante, permanecendo a reclamar por maiores direitos de liberdade religiosa. Isso levou a acontecimentos como o “Caso dos cartazes” (1534) e atos de iconoclastia (destruição de ícones) nas décadas 50 e 60, mostrando a insatisfação dos huguenotes com seus governantes católicos. Quanto mais os protestantes se mostravam insatisfeitos, mais eram perseguidos: 24 reformistas foram mortos por causa de cartazes antipapistas (LONGUEVILLE, 2020) e dezenas deles fugiram para a Suíça assim como Guillaume Farel (1489-1565) havia feito.
No mesmo período que a Reforma eclodia nos diversos países europeus, também se acelerava a corrida por terras no Novo Mundo. Francisco estava insatisfeito com a divisão promovida pela Igreja e chegou a questionar “gostaria de ver a cláusula de Adão pela qual a minha parte do mundo deveria ser negada”, ironizando o fato de o globo estar dividido entre as potências marítimas de Portugal e Espanha. Gradativamente os navios piratas enviados pela coroa passaram a invadir territórios ibéricos, atendendo as intenções colonialistas dos galicanos.
Quanto a Flórida, Juan Ponce de León descobriu-a em 1513 e em 1559 o dom Tristán de Luna y Arellano tentou estabelecer um assentamento em Pensacola que fracassou em 1561 devido a complicações com os nativos. Falhando ou não, o importante era ter sido o primeiro a identificar o território, regrada adotada por todos os países colonialistas, o que de fato os espanhóis conseguiram e fortaleceram a reclamação da península ao enviar quatro grandes expedições em menos de 30 anos.
Giovanni da Verrazzano (1485-1528), explorador italiano que serviu Francisco I, explorou a costa atlântica de Labrador até as Carolinas, possivelmente chegando a costa norte da Flórida em 1524, mas sem registro confirmado. A França se considerava detentora da terra vista e reclamada por Verrazzano, fator importante para os futuros conflitos.
Busca pela paz religiosa
Os franceses haviam tentado colonizar a América do Sul com a França Antártica (1555-1562) e os huguenotes viram nela uma oportunidade por liberdade de culto, sendo mandados para lá em 1557. Infelizmente, o resultado foi um grande infortúnio onde quatro se tornaram mártires e o resto foi expulso de volta para o país. A França assinou um tratado em 1556, concordando em não comercializar ou explorar as Índias Ocidentais sem a permissão da coroa espanhola, porém esse frágil acordo estava para ser quebrado.
“A Reforma enraizou-se fortemente nas cidades da Normandia e as da costa Atlântica, os portos mais experientes no comércio e incursão envolvendo o Novo Mundo” (SAUER, 1975, p.196)
Os protestantes calvinistas permaneceram buscando um local onde pudessem exercer sua religião livremente e a península do Atlântico onde flui o Saint John’s River, território da atual Flórida, foi o escolhido, tanto pelo alegado direito que a França teria sobre ele quanto pelo fato de ser mais próximo do que as terras sul-americanas. Contavam com os conhecimentos adquiridos por Guillaume le Testu (1509-1573), explorador huguenote mandado ao Brasil em 1551 para formar um mapa cartográfico que viria a ser usado por outros navegantes, traçando importantes rotas marítimas.
Em 18 de fevereiro de 1562, Gaspard II de Coligny (1519-1572), almirante francês e líder dos huguenotes nas Guerras Religiosas (1562-1598), enviou dois navios do porto de Le Havre comandados por Jean Ribault (1520-1565). Eles avistaram a costa leste da Flórida em torno de abril e no mês de maio se aproximaram da atual Jacksonville, onde está o St. John’s River, nomeado “Rio Maio” (Rivière de Mai) pelo mês em que o viram.
Em 17 de maio entraram numa grande abra nomeada Port Royal e descrita por Ribault como “um dos maiores e mais belos paraísos do mundo”. Ergueu um monumento de pedra para marcar a presença francesa e estabeleceu um assentamento permanente chamado Charlesfort, em homenagem ao rei Carlos IX (1560-1574), deixando 26 homens para gerencia-lo após sua partida de volta a França. Esse território abrange hoje Paris Island da Carolina do Sul, sendo um importante marco na história do país.
Charlesfort progrediu lentamente com o capitão Albert de la Pierria e os homens sob seu comando, porém deduziram erroneamente que haveria alimento suficiente no local para o ano todo. A vegetação exuberante rendia bons frutos, porém os mesmos não permaneceram no inverno rigoroso e eles foram obrigados a racionar intensamente a comida restante, dependendo de provisões rendidas gratuitamente pelos chefes indígenas Convexis e Ouade. Toda a estrutura chegou a ser incendiada, possivelmente por nativos opositores, mas com seus aliados puderam reconstruir.
Ribault retornou a França e se deparou com a primeira guerra civil dentre as guerras religiosas, ajudando os huguenotes em Dieppe mas partindo em breve para a Inglaterra, onde buscou apoio da rainha Elizabeth I (1558-1603) mas acabou preso por suspeita de espionagem. Charlesfort cairia em ruína após um motim movido contra a disciplina rigorosa de Albert, responsável por exilar um soldado chamado Lachere que quase morreu de fome. Os revoltosos se juntaram para matar seu líder e decidiram abandonar a colônia após mais de oito meses da ausência de Ribault, deduzindo que seu país não os ajudaria.
Construíram um barco improvisado e partiram para França, enfrentando meses de fome e deriva, sendo obrigados ao canibalismo até serem resgatados por um navio inglês. O forte, então, foi dominado pelos espanhóis após um ano de existência.
O Fort Caroline
Contudo, o almirante Coligny não desistiu. “Na mente do grande líder huguenote os espanhóis eram inimigos de seu país e sua religião, e sua grande paixão dominante era destruí-los ou, fracassando nisso, ao menos enfraquecê-los” (DOWNEY, 1934, p.33). Após a paz de Amboise (1563), Coligny organizou uma nova expedição e no ano de 1564, o tenente Rene de Laudonnière (1529-1574) contou com seu apoio para iniciar a colônia protestante no continente americano, juntamente do capitão Ribault. A frota inicial era pequena, em torno de três navios com 300 homens, contudo suas fortes motivações religiosas os mantiveram firmes nessa árdua expedição e partiram em 22 de abril de 1564, chegando ao destino em 22 de junho para estabelecer um segundo assentamento na mesma região. Foram bem recebidos pelos nativos que haviam ajudando a construir o Charlesfort anteriormente, um fato que o próprio Laudonnière agradeceu como sendo providência divina (LAUDONNIÈRE, p.67), mostrando o espírito de pacificação dos huguenotes com os indígenas.
O primeiro rio que encontraram foi nomeado la Rivière des Dauphins (o Rio dos Golfinhos) por Laudonnière, partindo para o Rio Maio para ancorarem, região que agradou os colonos e onde eles fundaram o Fort Caroline, na atual região de Jacksonville (FL), honrando novamente o rei Carlos.
Em 30 de Junho de 1564 eles guardaram o dia como uma ação de graças ao Senhor e ofereceram a primeira oração protestante da América do Norte:
“Nós cantamos um salmo de ação de graças a Deus, suplicando a Ele que lhe agradasse manter sua bondade costumeira para conosco”. (BUSECK, 2008).
O forte tinha uma forma triangular, o lado oeste voltado para a terra e protegido por um fosso erguido sobre relva feita em forma de parapeitos de quase 3 metros de altura. O lado voltado ao rio foi fechado por uma paliçada feita em forma de gabiões e o lado ao sul possuía uma espécie de bastião onde havia um armazém para munição. Todo o conjunto foi construído de areia e fascinas, feixes ásperos feitos de madeira bruta ou outro material usados para fortificar estruturas de barro.
Jean Ribault estava previsto para zarpar em maio e se encontrar com Laudonnière na primavera de 1565, trazendo suprimentos e mais homens para trabalhar, mas atrasos de gestão e clima atrasaram em um mês e em junho de 1565 partia com cinco navios e 600 a 800 soldados e colonos, variando as estimativas, para reforçar o Fort Caroline. O próprio rei francês se opôs a empreitada de Ribault, ciente do grande perigo, porém ele resistiu e se dispôs a cruzar o oceano para ajudar seus irmãos protestantes que batalhavam por uma nova vida no Novo Mundo, partindo a despeito da oposição de sua terra natal e da Espanha. Ribault sabia que se atrasasse mais o retorno uma tragédia irreparável aconteceria ao Fort Caroline, assim como aconteceu com a grande fome que sofreram os colonos de Charlesfort.
Resposta espanhola
Naquele tempo, a América do Norte pertencia a coroa espanhola segundo o Tratado de Tordesilhas (1494), concessão feita pelo papa Alexandre VI (1492-1503) que nessa época era tida como um documento morto por outras potências europeias senão por Portugal e a própria Espanha. A notícia de uma colônia francesa revoltou o monarca Filipe II da Espanha (1556-1598), grande militante da Igreja Romana que se via como protetor da cristandade; a empreitada de Laudonniére o revoltou pela invasão ao seu terreno mas ainda mais pelos “hereges”. Apelou ao Conselho das Índias que asseguraram o incontestável domínio espanhol sobre o território, considerando todos os huguenotes usurpadores de seu terreno, vendo a si mesmo com um dever não só político como religioso em defender a Igreja.
Imediatamente após a partida de Ribault, o rei espanhol despachou uma frota de onze navios tripulados por 600 soldados e muitos colonos, somando mais de 1000 tripulantes (BRYANT, 2020), comandados pelo general Pedro Menéndez de Aviles (1519-1574), cruel almirante vindo das Astúrias que recebeu a grande missão de exterminar os hereges e piratas das santas terras pertencentes a Espanha e a Igreja Católica. O objetivo era que em três anos houvesse um assentamento permanente espanhol que impedisse a organização dos franceses e seu fortalecimento na região. Menéndez desejava ir para a Flórida há mais de dois anos, pois o navio de seu filho, o Almirante Júan Menéndez, havia se perdido na latitude próxima da Carolina do Sul e após ter seu pedido negado constantemente, finalmente pode usar da oportunidade para ir ao território. Carregava também um ódio especial contra os huguenotes franceses por ocorridos de pirataria no Caribe e claro, por sua fé protestante, tendo em alta estima a atribuição dada a ele pelo rei.
Eles partiram em 29 de Junho, passaram pela América Central e sofreram obstáculos climáticos, perdendo seis navios no percurso, mas em 4 de setembro avistaram quatro veleiros franceses e manobraram para ancorar perto deles, voltados contra o galeão francês que liderava o pequeno grupo. A distância, Menéndez afirmou que aquele território pertencia a Filipe II da Espanha e inquiriu o capitão do galeão, autonomeado como Lorde Gastão, que respondeu estar trazendo soldados e suprimentos ao forte do rei francês. Ao perguntar o nome do capitão espanhol, ele respondeu, “Sou Pedro Menéndez de Aviles, Capitão General do Rei da Espanha, que veio enforcar todos os luteranos que encontrar aqui” (DOWNEY, 1934, p.72). Nessa época, os católicos entendiam protestantes como luteranos de maneira geral, termo pejorativo aos “hereges reformistas”.
Segundo o historiador David Abresú, Menéndez não esperava que houvesse uma frota tão grande de navios franceses, visto que o reforço de Ribault conseguiu antecedê-lo em poucos dias. Assim, após uma curta perseguição ocorrida entre eles e o galeão francês, os espanhóis recuaram para a primeira terra que haviam visto e em 8 de setembro, desembarcando na costa, fundam a vila de St. Agostinho, nomeada por ter sido vista no dia de sua festa de dedicação, 28 de agosto. Uma missa Te Deum foi celebrada pelo padre Francisco Lopez de Mendoza Grajales, a primeira da região. Esse se tornaria o primeiro assentamento europeu permanente que perdurou no continente norte-americano.
O massacre
No dia 28 de setembro, os espanhóis foram alertados pelos indígenas timucua da tribo Utina, desafetos dos franceses, de que haveria um navio ”de homens brancos” naufragado ao sul, um dos navios da frota de Ribault. Menéndez enviou um grupo de 50 homens junto com indígenas guias para identificar o inimigo, dentre eles o padre Francisco Lopez de Mendoza Grajales que deixou um relato do acontecimento. O general, “iluminado pelo Espírito Santo”, vestiu-se como marinheiro e capturou um francês que informou que “todos, ou pelo menos grande parte deles, eram luteranos”. Outros afirmaram o mesmo quando disseram “Somos todos luteranos”, relatando serem 200 homens seguidores do capitão Ribault.
Menéndez revelou sua identidade e contou sobre o massacre no forte, mandando que ele voltasse e avisasse ao grupo que se rendesse e baixasse as armas, ou todos morreriam. Outro francês voltou assentindo com a rendição se suas vidas fossem poupadas. O “corajoso capitão-general”, Menéndez, recusou-se a fazer qualquer tipo de promessa, pois caso decidisse poupar a vida deles, seriam gratos, mas caso se recusasse não haveria nada para se queixar. Além disso, quando questionado se poderia enviá-los de volta a Europa, afirmou que “Se fossem católicos em vez de huguenotes, os enviaria de volta de bom grado”, porém como eram luteranos, via-os como inimigos e os enfrentaria “com fogo e espada, seja terra ou mar, pelo Rei, visto que vim aqui estabelecer a santa fé católico romana na Flórida” (DOWNEY, 1934, p.90).
Os franceses, sem comida e armas devida ao naufrágio, ficaram sem escolha, fizeram o que ordenou e se renderam incondicionalmente. Deixo agora o relato de Francisco:
“Descobrindo que todos eles eram luteranos, o capitão-general ordenou que todos fossem mortos; mas, como eu era um padre, tendo misericórdia em minhas entranhas, implorei a ele para garantir o favor de poupar aqueles que encontrássemos serem cristãos. Ele permitiu; fiz investigações e encontrei dez ou doze homens católicos romanos, os quais nós trouxemos de volta. Todos os outros foram executados, porque eram luteranos e inimigos de nossa santa fé católica. Tudo isso ocorreu no Sábado (Dia de de São Miguel), 29 de setembro, 1565.
“Eu, Francisco Lopez de Mendoza Grajales, capelão de Nosso Senhor, certifico que a afirmação supracitada é o que de fato aconteceu” (LOPEZ, 1900)
O mesmo teria dito “Todos tiveram suas gargantas cortadas. Parece para mim que eu servi a Deus e Sua Majestade em punir eles por isso, pois pelo menos essa seita maligna não mais bloqueará nossos esforços em disseminar a boa palavra nesses países” (GAFFAREL, 1875, p. 229)
Em grupos de dez eram conduzidos e questionados se eram católicos professastes segundo as ordens do rei Filipe. Os que eram, foram conduzidos em segurança a St. Agostinho. Os que não, eram levados para uma duna e mortos na espada ou levando tiros na cabeça. Todos os corpos foram empilhados e queimados até serem uma mera pilha de cinzas na praia da Flórida. Foram 111 franceses mortos, a ampla maioria sendo protestante. Apenas alguns poucos católicos, uns marinheiros bretões e quatro artesãos foram poupados, totalizando em torno de 16, mas é importante ressaltar que nem todos os católicos aceitaram a piedade do padre espanhol, preferindo morrer ao lado dos franceses, embora com religião distinta.
Duas semanas depois, os espanhóis se depararam com mais franceses da frota fracassada, incluindo Jean Ribault. Após ambos os lados ergueram bandeira branca, o capitão se encontrou com Menéndez e pediu por misericórdia caso um dia o espanhol se encontrasse na mesma posição, recebendo de volta a benfeitoria, porém ele negou, juntamente com a possibilidade de um grande pagamento. Assim como anteriormente, recusou a ser “fraco” por avareza e se fosse misericordioso, o seria livremente e não por dinheiro.
Em 12 de outubro eles se renderam com um subentendido acordo de misericórdia e foram levados amarrados para St. Agostinho. Quando Menéndez perguntou, ele afirmou que eram todos luteranos e começaram a cantar o salmo “Domine momento mei” (Sl 131). Ao terminarem, o general afirmou que “eles eram pó e ao pó devem voltar”.
Quando perceberam que seriam mortos, clamaram pela aplicação do acordo feito com Menéndez, mas os espanhóis ignoraram. Um deles questionou a Ribault se ele realmente não esperava que quando desse ordens a seus soldados, esperasse que eles obedecessem. O capitão disse que sim e o soldado enfiou uma adaga em seu peito, dizendo “Eu também devo obedecer as ordens de meu comandante. Sou ordenado a te matar” (DOWNEY, 1934, p.94). O mesmo procedimento foi usado contra D’Ottigny, um dos capitães franceses e todo o resto foi ordenado ser morto por serem luteranos, inimigos de Deus e da Virgem Maria.
O massacre totalizou 134 vítimas, sendo conhecido como Massacre da Enseada Matanza. O ocorrido foi lembrado no Fort Matanzas (“matanças”) e no Rio Matanzas, nomeados pelo acontecimento trágico.
O número total de vítimas huguenotes foi de 385, podendo ser ainda maior por outros números. A causa do massacre foi explicitamente religiosa, fator ressaltado por Menéndez, Filipe e o professor contemporâneo Bartolomé Barrientos, que disse sobre o capitão: “Ele agiu como um excelente inquisidor; pós quando perguntado se eram católicos ou luteranos, eles ousaram proclamarem-se publicamente como luteranos, sem temor de Deus ou vergonha diante dos homens; e assim ele lhes deu a morte que sua insolência merecia. Até mesmo nisso ele foi misericordioso garantindo-lhes uma morte honorável e nobre, cortando suas cabeças, quando poderia legalmente queimá-los vivos” (LOKER, 2010, p.199)
O próprio Menéndez escreveu ao rei sobre outros franceses, em torno de 150, que haviam escapado do forte depois da invasão e que passaram a viver dispersos entre os nativos. “Visto que são luteranos e a fim de que tão vil seita não permaneça viva nessas partes, eu mesmo conduzirei em tal prudência e incitarei meus amigos, os indígenas, de sua parte para que em cinco ou seis semanas poucos deles, se algum [francês], permaneça vivo.” (NORMAN, 1968, p.148) Mostra-se orgulhoso que de uma arma de mil homens e doze navios, tenham sobrado dois barcos e 50 pessoas.
A carta deixada por Laudonnière culpa o atraso de Ribault em encontrá-lo como a causa do fracasso, mas com toda a certeza outros fatores foram mais determinantes.
Em 2008, a Capitol Hill Prayer Partners escreveu: “Embora tenham morrido como mártires há 444 anos (456 atualmente), o sacrifício dos franceses huguenotes na Flórida permanece na eternidade e o preço foi pago nos céus pela nossa liberdade nesse solo, aqui na terra. Louvado seja Deus… eles não amaram suas vidas até a morte (Ap 12:11)” (via CBN).
Consequências
Conclusão
A fundação de St. Agostinho tornou-a a primeira cidade oficial no território dos Estados Unidos, sendo a capital da Flórida Espanhola por 200 anos e tornando-se a capital da Flórida Leste dos britânicos. Considerando que ela foi fundada como resposta ao assentamento huguenote, eles foram diretamente responsáveis por um dos grandes marcos na colonização do continente norte-americano, assim como foram na América do Sul.
A oposição aos huguenotes é histórica, especialmente por historiadores como John Gilmary Shea que justifica a postura espanhola devido aos atos de pirataria descritos. Contudo, os colonos huguenotes não eram piratas e condenaram uma tentativa esporádica de pirataria que surgiu em Charlesfort, condenando a pena de morte os revoltosos. Em teoria, o terreno era dos espanhóis, mas eles mesmos eram invasores em terras de indígenas, matando muitos deles em todo o Novo Mundo. Os huguenotes não tem menos direito sobre a colônia do que puritanos em Massachusetts e católicos em Maryland. O Fort Caroline nunca teve intenção de embate contra os espanhóis.
“Esses homens vieram com intenção pacífica; eles vieram para fundar lares e desenvolver um assentamento, sendo evidente pelo fato que trouxeram mulheres e crianças com eles. (…) Menéndez, como cristão que professava ser, poderia ter encontrado outros meios de expulsar esses franceses” (DOWNEY, 1934, p.107)
Alguns propuseram que Menéndez consentiu com a morte dos franceses para evitar uma crise de fome mas o relato do padre deixa claro como o fato religioso foi determinante para o massacre perpetuado pelos hispânicos. Sem contar que eles não estavam em uma crise fome eminente, como os franceses tiveram em outras ocasiões. Não há justificativa para o massacre criminoso dos espanhóis contra franceses. Além de toda a disputa territorial e colonialista, havia duas fés conflitantes em encontro, uma dominante e outra perseguida, buscando por pacificação e liberdade de culto. Em todo o lugar que os protestantes franceses buscassem um local para se estabelecer, encontravam perseguição e restrição de direitos básicos, impedidos de florescerem socialmente.
O sangue desses huguenotes derramado sobre as terras americanas jamais será esquecido.
Luigi Bonvenuto.
Fort Caroline. John Ogilby, 1671, in America Being the Latest and Most Accurate Description of the New World, Arnold Montanus. |
Massacre at Matanzas Inlet, Florida Memory. Public Domain |
Florida, 1562, Woodbury Lowery, The Spanish Settlements within the Present Limits of the United States: Florida (New York, NY: G. P. Putnam’s Son, 1911) |
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